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Chavismo está eliminando o sindicalismo independente
quinta-feira, 17 de agosto de 2017
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O governo, reclamam sindicalistas e empresários, não respeita convenções coletivas e ignora reivindicações de aumento do salário mínimo feitas por trabalhadores. Tais dinâmicas, afirmam, são parte de um processo que começou com o ex-presidente Hugo Chávez, mas vêm sendo aprofundado por Nicolás Maduro.
"O movimento sindical venezuelano enfrenta dificuldades desde os anos 1990, mas, com o chavismo, foi praticamente exterminado", analisa Ivan Freites, representante da Federação Petroleira da Venezuela e dirigente sindical há 24 anos. "Há 15 anos, o governo viola as convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT), pois recolhe a contribuição sindical de 1% do salário de funcionários do setor público, mas não a repassa aos sindicatos."
Dentre as justificativas do governo para o não repasse estão a de que os números de filiados não coincide com as folhas de pagamento das empresas ou a de que determinados sindicatos não realizaram eleições, afirma Carlos Patiño, coordenador da ONG de direitos humanos Provea.
Parte da explicação por trás de governo e sindicalistas estarem hoje em lados opostos é, segundo Freites, a greve petroleira de 2002, convocada por empresários e sindicatos insatisfeitos com Chávez. "Hoje, os dirigentes sindicais que não apoiam as políticas do governo são presos e mortos", diz.
De acordo com a Provea, nos últimos 15 anos, mais de 300 sindicalistas foram assassinados na Venezuela. "A maioria das mortes são decorrentes de disputas entre sindicalistas pró e contra o governo e de assassinatos sob encomenda. Não se pode comprovar responsabilidade direta do governo nos casos, mas há uma grande impunidade em relação a esses crimes", explica Patiño.
Segundo relatório de 2016 da ONG, há na Venezuela "obstáculos e ameaças ao exercício do direito à liberdade sindical, com criminalização do sindicalismo autônomo, detenções e julgamento de dirigentes sindicais e trabalhadores". No ano de 2015, afirma o relatório, foram "22 dirigentes sindicais assassinatos".
O cerco a entidades sindicais fez dirigentes levarem uma carta à OIT no início de junho, na qual comparam a situação atual da Venezuela à Polônia de 1982, quando o então governo comunista proibiu a existência do sindicato Solidariedade. "Todos os dias há novos relatos de perseguição. Dirigentes sindicais desaparecem. Serviços de inteligência grampeiam linhas telefônicas e fazem buscas nas casas de sindicalistas", diz Servando Carbone, coordenador da União Nacional de Trabalhadores (Unete).
Outra reclamação que chega à OIT é a de empresários e sindicalistas que pedem a volta de negociações tripartites entre governo, empresas e sindicatos para temas como o salário mínimo, diz María Carolina Uzcátegui, presidente do Conselho Nacional do Comércio e dos Serviços (Consecomercio). Maduro decretou no início de julho o sexto aumento do salário mínimo em um período de 14 meses. Uzcátegui argumenta, no entanto, que os reajustes são fruto de "decisões unilaterais do governo".
Jorge Roig, empresário do setor metal-mecânico e representante da Venezuela no Conselho Administrativo na OIT, diz que a organização está recebendo demandas tanto de trabalhadores quanto de empresários contra o governo. "Temos uma guerra conjunta, por distintas razões. Dizemos que o governo nos persegue e desapropria nossas empresas. Os sindicalistas reclamam da falta de respeito a contratos coletivos e da proibição de eleições de entidades sindicais."
Para Placido Mundaray, da Confederação de Sindicatos Autônomos da Venezuela (Codesa), o governo põe a "ideologia partidária acima de demandas sociais da classe trabalhadora". "O chavismo golpeou os sindicatos do país. Hoje, Maduro só favorece sindicatos bolivarianos. Das cinco grandes centrais, a única que recebe os repasses é a Central Bolivariana Socialista de Trabalhadores", diz.
A proliferação de novos sindicatos, a maioria ligados ao governo, é vista como uma espécie de "paralelismo sindical" utilizado pelo chavismo para diminuir a força das centrais tradicionais, segundo Rafael Uzcátegui, diretor da Provea. No livro "Venezuela: la Revolución como Espectáculo", de 2010, ele lembra que outro elemento para reduzir a força do sindicalismo na Venezuela teria sido a própria criação do PSUV, "que nas palavras do primeiro mandatário [Chávez] deveria absorver todas as iniciativas orgânicas que apoiam o processo bolivariano, incluindo as organizações sindicais."
"Em 2003, Chávez dá início a uma política que permitiu a multiplicação anárquica de sindicatos, com o intuito de diluir o poder dos já existentes", diz Maryolga Girán, advogada da comissão de assuntos trabalhistas da Confederação Venezuelana de Industriais (Conindustria). Ela afirma que entre 2001 e 2006 o país viu nascerem 12 mil sindicatos para 3.000 empresas, todos com o termo bolivariano no nome. "Hoje apenas os dirigentes sindicais afeitos ao governo gozam dos benefícios previstos em lei. Os que reclamam seus direitos acabam perseguidos", conclui.